Eram duas. Na
época, andavam pelos dez, doze anos, quase adolescentes.
Batiam à porta,
todo dia, na hora do almoço, pedindo comida. Não se agradando do “cardápio”,
jogavam tudo fora logo na primeira esquina.
Nunca foi
possível manter um diálogo com elas. Pareciam habitar outro mundo.
Agora, já devem
estar adultas. E desapareceram de nossas portas.
Pensar que
estão bem instaladas na vida, com
marido, filhos bem cuidados, é ser muito otimista.
Mais certo é
supô-las como vítimas de vícios ou desses crimes que vêm ocorrendo em nossa
cidade, nos pátios de prédios abandonados. Crime passional, pela divisão de
coisas roubadas. Ou drogas.
Na escola da
vida em que se formaram, só podemos esperar algo semelhante.
A verdade é que
as vilas da periferia se expandem assustadoramente, sem que se saiba de onde
vêm e do que vivem seus habitantes. Os primeiros, supõe-se, são os gaúchos a
pé, aqueles que perderam seu ganha pão na campanha e vêm tentar a sorte na
cidade.
Mas os empregos
são poucos, e os mais jovens descambam facilmente para o crime, o submundo, a
marginalidade. Os valores da família são logo esquecidos. A própria família
desaparece, aos poucos, e só restam os filhos de ninguém.
Pode parecer
que os problemas sociais não existam, ou diminuíram, porque é raro encontrar um
pedinte nas ruas do centro.
Mas a miséria
continua escondida, com gente velha e doente, mas honrada, com vergonha de
pedir. É preciso procurá-los, levar-lhes algum conforto , no meio da
indesejável vizinhança de delinqüentes, mulheres da vida, arruaceiros.
Entretanto, a
solidariedade ainda existe entre eles, e quando a gente vê gente humilde e
carente repartindo o pouco que tem com seu vizinho mais necessitado, renasce a
esperança de que o mundo dos homens ainda não está totalmente perdido.
Mas, e aquelas
meninas, onde estarão agora?