Errata:
Na crônica As Vovós e os Botões cometi um engano. Em vez de escrever FRANCISCO ALVES, escrevi Francisco Carlos. Desculpem. Feliz Ano Novo.
terça-feira, 31 de dezembro de 2013
segunda-feira, 30 de dezembro de 2013
AS VOVÓS E OS BOTÕES
Considero-me privilegiada. Vivo em dois mundos. Sou do tempo do Repórter
Esso com as notícias da 2ª Guerra Mundial, do Rei da Voz Francisco Carlos, da
capital da república no Rio de Janeiro, das Rainhas do Rádio Emilinha Borba e
Marlene e agora vou festejar o centenário de Lupicínio Rodrigues, que considero
ainda novo, um guri.
Atravessei muitas fases em que as modas eram outras e agora são imitadas
de forma estilizada. Rui Spohr se refere às tendências dos anos 50, 60, 70,
como se fossem muito antigas – mas com todo o respeito – e eu acho que elas
parecem ter acontecido ainda ontem...
Quando me olho no espelho, fico comparando meus sinais de idade com os de
minhas tias faceiras que não se descuidavam dos cremes. Peles muito boas, bem
claras e protegidas do sol. Elas se horrorizavam quando nos viam de volta da
praia bem escurinhas. Tinham razão, ainda mais se considerarmos as deficiências
da camada de ozônio de agora. E dizer que em criança fiz aplicações de
ultravioleta para curar minha anemia.
Neste verão escaldante do mês de dezembro, fico imaginando como as
coitadas suportavam o calor da estação com as roupas que usavam. Nada de
bermudas e camisetas, nem calças jeans. Shortinhos e vestidinhos, nem pensar. Eles
tapavam os joelhos, com mangas até quase a metade do
braço e decote - só nos vestidos de
festa.
Mas o que mais me causa admiração eram os mantôs pretos, de seda pesada
que as tias e avós daquela época usavam. Eram abotoados de cima abaixo com
botões forrados do mesmo tecido, e as alcinhas para fechá-los tinham um
acabamento perfeito. Que trabalheira para vestir ou despir!
Tudo, porém, tem suas compensações, e a gente acostuma logo com os novos
hábitos.
O mundo girou, girou, as maquininhas surgiram, e ninguém escapa de sua
tecnologia. Nem os menos letrados, pois para receberem a aposentadoria têm sua
senha e devem apertar os botões.
Enquanto me familiarizo com a TV de alta fidelidade, os skipes e novos aplicativos do computador
– já apertei botões errados, e só os filhos, netos ou sobrinhos me tiraram dos
apuros – vou bendizendo certas inovações que nos vêm dando uma vida mais
confortável. Ventiladores, ar condicionado, batedeiras e liquidificadores, como
é que nossas avós viviam sem eles? Sem celular, ficando dias e dias esperando
notícias dos filhos! Agora é só clicar e já sabemos onde estão e o que fazem.
Cada dia mais aperfeiçoados e inteligentes.
As vovós de agora deixaram o cesto de costura de lado e se ocupam com o
Notebook. Os botões são outros, mas a
satisfação de conectar-se com o mundo, a vida, as pessoas queridas é mil vezes
maior.
Um Feliz Ano Novo com tudo o que temos direito. Deus nos abençoe.
sexta-feira, 27 de dezembro de 2013
MAIS UM ANO
Não vejo mais a figura do velhinho encurvado, cajado no ombro e um cartaz
com o número do ano que se despede. E do outro lado o bebê sorridente,
coradinho, de cachinhos loiros, acenando com o novo estandarte do ano que vai
começar. Estavam sempre na sobrecapa do calendário. Dá uma peninha na gente aquele
vovozinho e, por que não confessar, também do menininho inocente. Sabe-se lá o
que terá de viver. Mas a hora é de
comemoração, a família toda brindando às boas coisas que aconteceram e em especial
ao amor e à compreensão que nos vêm unindo há tanto tempo. Que bom!
Se formos lembrar tudo o que aconteceu, vamos dar razão a qualquer
cartomante que previu coisas boas e coisas ruins. Tragédias e conquistas, gente
famosa morrendo, calouros “bombando”, políticos e criminosos aprontando novos
golpes - nenhuma novidade, já vimos esse filme que vem sendo repetido há
séculos e séculos.
Mas, procurando esquecer as grandes tristezas coletivas, e a mágoa da
perda de amigas queridas, um grande acontecimento foi a visita do Papa ao
Brasil na Jornada Mundial da Juventude. Foi quando se revelou a verdadeira alma
do povo brasileiro. Gentil, sonhador, acolhedor e piedoso. Além das aparências,
apesar das falhas da Segurança, da ganância dos aproveitadores e oportunistas,
o clima daqueles abençoados dias foi perfeito, lembrando os primeiros tempos do
cristianismo. Até hoje as imagens daqueles dias tão especiais nos animam
fazendo crer que a bondade existe.
O verão chegou no dia certo e com ele o calor que promete aumentar ainda
mais. As pobres flores dos canteiros das avenidas e jardins – ainda bem que
recebendo boas aguadas – vão ficando murchinhas sob o calor do sol. As
hortênsias, coitadas, apareceram tão vistosas e agora têm a aparência de fim de
estação. Geralmente dá gosto chegar perto e sentir seu frescor. Elas me lembram
os fins de ano com suas formaturas e entregas de prêmios escolares. A grande
mesa do salão da escola secundária era sempre ornamentada com essas flores, os
professores tinham um ar solene ao entregar-nos as notas – resultados de um ano
dedicado ao estudo e com muitos sacrifícios e privações em prol do sucesso
esperado.
No primário, os exames finais tinham um clima austero, o coração da gente
batendo forte enquanto os pontos da prova eram sorteados, papel almaço em
prontidão, com a margem devidamente dobrada, os tinteiros no vão próprio para
eles nas carteiras de madeira maciça recebendo tinta de uma garrafa tamanho
família, e finalmente a ordem de “começar”.
Dias depois, junto à entrega dos boletins, havia a exposição dos
trabalhos manuais realizados no ano. Meu pobre guardanapo - de quarenta por
quarenta centímetros - era minha única obra, de longe competindo com as belas
toalhas de chá bordadas por minhas colegas, com pontos de Richilieu, pintura de agulha e outros bem complicados e lindos.
Minha mãe, depois de uma boa lavada, enfeitava-o com uma pontilha de crochê e o
engomava. Assim parecia mais atraente o coitado. Em compensação, minhas notas
mereciam “troféus”, como um cartão pintado pela Irmã Laurentina, que além de
artista plástica era nossa professora de música. Com todos os conhecimentos que
ela trouxe do Velho Mundo e da sua saudosa Alemanha.
As salas de aula, então, mudavam de aspecto. Chão de madeira devidamente
lavado de escova, bem como as carteiras na ocasião cobertas com os trabalhos
das alunas, não tinham mais o ar de ambiente de estudo que tanto nos ocupou
durante o ano. E as hortênsias ali estavam também.
Nossos fins de ano mudaram tanto nas últimas décadas. Meus manos e eu
agora somos do primeiro escalão, os venerandos, que nas festinhas familiares
ocupam os primeiros lugares nas mesas. Parece que foi ontem o tempo em que
servíamos o chá ou refrigerantes nos aniversários de nossos pais! Os dias e anos passaram tão rápido que ainda não
assimilei meu novo papel. Acho graça quando alguém me dá o braço para subir ou
descer uma escada, transpor algum obstáculo, enfim... Ainda me sinto a filha
daqueles velhinhos queridos que só nos deixaram lembranças doces e uma grande
capacidade de amar assim como eles nos amaram.
Minhas amigas de mocidade estão-se indo. Mas não me sinto só, pois agora tenho a graça de fazer novas amizades,
gente mais nova que eu, que me acompanharão até o fim.
Bendito ano que passou, com suas tristezas superadas e expectativas de
dias felizes. Na convivência de filhos, irmãos, amigos que são o meu mundo.
Pensando bem, as alegrias foram em maior número. Obrigada, meu Deus.
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