Há anos procuro, nos sebos, livros preciosos que fui perdendo ao longo da
vida. A falta que me fazem! Parecem pessoas queridas que não vejo mais, nem
tenho notícias.
Neste verão escaldante tive a satisfação de encontrar um e outro, bem amarelinhos,
mas inteiros, esperando por mim nos balaios das livrarias de usados.
O último deles, perdi a esperança de reencontrá-lo, mas depois os mais
jovens da família me ensinaram a
procurá-lo na Internet. E
reiniciei sua busca.
Naquele calorão abafado de Porto Alegre, aproveitei a última manhã
passada lá para tentar novamente. Nos sebos da Rua da Praia, mocinhas gentis me
atenderam prontamente dirigindo-se logo ao computador. Nem elas tinham
esperança de encontrar o livro “O Manto de Cristo” que eu tanto desejava. Elas
me olhavam como a uma sobrevivente de um mundo que não conheceram. De pessoas
piedosas que não abandonaram sua fé e ainda se interessam pela história sagrada. Hoje os
assuntos de livros são bem outros. O mundo também.
Até que uma atendente me indicou um sebo na Rua da Ladeira, ali perto.
Acontece que dobrei na esquina anterior e passei pelos portões da Caldas
Júnior, onde me achei em
casa. Afinal , há quantos anos sou assinante do Correio do
Povo, o “jornal do homem sério” como meu pai repetia. Assim, atrevi-me a
perguntar ao porteiro ali empertigado o endereço que desejava. Ele foi bem
amável e me indicou uma rua paralela, mas que eu podia seguir por ali mesmo e
dobrar à esquerda. Como a outra, esta também era uma ladeira que eu fui subindo
com certo esforço. Parecia que o ar me faltava, mas eu pensei que minha missão
era importante e que eu chegaria ao final. Não deu outra, foi um alívio dobrar
a esquina e seguir no plano até chegar à esquina e começar a descer – que bom
que agora era só descida – até encontrar a referida livraria. Dois atendentes,
senhores de meia idade, entenderam logo meu pedido. Um deles dirigiu-se ao
balaio de livros usados e facilmente encontrou o livro que por muitos anos eu
procurava. Tive vontade de fazer um brinde com champanhe, tal a importância da
ocasião, mas contentei-me com água mineral na primeira lanchonete que
encontrei. Que sede que eu sentia!
Voltando pelo mesmo caminho, passei novamente pelos portões da Caldas
Júnior onde o porteiro e outro senhor de cabelos brancos, bem apessoado, me
perguntaram se eu encontrara o endereço. Agradecida, mostrei-lhes a sacola com
o precioso livro. E a impressão que me ficou é que a cidade grande ainda tem
remédio. Não é só de assaltantes, bandidos e pessoas mal intencionadas. Sobram
almas boas que se solidarizam com seus semelhantes e estão dispostas a ajudar a
quem precisa.
A manhã me pareceu mais suave, e o dia transcorreu com uma nova alegria a
entreter-me o coração. Pensei na minha irmã que há tempos me pede este livro
que começara a ler, e alguém o levou não sei pra onde. Agora retornou e deve
enternecer outros corações com a história de Cristo em sua passagem sobre a
terra, como humano igual a nós e sujeito às mesmas dores e desilusões. Desta
vez, ao emprestá-lo, vou tomar nota para quem e fazer a devida cobrança se
demorar a voltar. Não vou deixá-lo sumir
de novo.