Quando acordo de madrugada, fico em vão esperando ouvir o canto dos galos
que antes se “comunicavam” de terreiro a terreiro com seu clarim natural. Fico
lembrando os velhos pátios povoados de galinhas cacarejantes, patos, marrecos,
cachorros e por vezes algum porco engordando no chiqueiro, ou peru com trato
especial à espera das festas de fim de ano.
Nas chácaras, os gansos tinham sua hora certa de ir à lagoa para o
costumeiro banho refrescante. Em fila, passavam por baixo da porteira e seguiam
majestosamente sem olhar para trás. Orgulhosos e felizes.
Os porcos transitavam livremente pelo pátio até serem selecionados para o
engorde. Então, ficavam no chiqueiro recebendo rações extras até chegarem ao
ponto do abate. Mas pareciam satisfeitos e só pensavam em comer.
Há dias, numa reportagem da Globo,
vi uma porca numa pocilga moderna, com todas as medidas de higienização
obedecidas. Mas, coitada, acabara de parir uma porção de leitõezinhos, e seu
espaço mal dava para acolher os filhotes para as mamadas, e as grades que
limitavam sua raia faziam feridas em seu dorso quando tentava mudar de posição.
O que era impossível.
Mundo moderno é esse nosso que tira o direito ao bem estar dos animais
que nos alimentam, isso em nome do lucro, do progresso, do enriquecimento de
seus proprietários.
Tenho-me cuidado para não dizer de vez em quando: “no meu tempo não era
assim...”
Mas não se ouviam então notícias de ladrões atearem fogo nas vítimas sem
dinheiro ou com pouco, para a sua ganância. Não havia filhos matando pais, ou
pais entregues às drogas negligenciando os filhos. Nem idosos abandonados à
própria sorte, enquanto suas magras pensões sustentam filhos e netos. Esses não
pensam que a fonte um dia vai acabar? Mais cedo até por culpa deles que não trataram
bem sua galinha dos ovos de ouro.
No meu tempo, os moradores das ruas por onde passava a Procissão de
Corpus Christi enfeitavam suas moradias com palmas, flores, imagens de santos e
pequenos altares. Hoje, nem as Escolas atenderam ao convite da Paróquia e
deixaram os portões fechados, mudos, sem nenhum sinal de vida.
No meu tempo... nas escolas públicas os professores ensinavam religião e
preparavam os alunos para a primeira Eucaristia. Não se importavam de
sacrificar seus domingos para
acompanhá-los nas missas. Havia então a época das Páscoas: dos
estudantes, dos bancários, dos operários, dos doentes, presidiários, dos
homens, dos jovens, enfim, era um tempo de confissões e exames de consciência.
Alunos de outros credos não precisavam assistir às aulas de religião, e
para eles se preparava outra atividade na mesma hora. Mas o consenso entre
professores, pais e o próprio sistema de ensino é que era preciso formar o lado
espiritual da criança e do jovem. E não como agora que deixam que eles escolham
seu credo depois de crescidos. Mais tarde, sozinhos, rodeados das tentações e
superficialidades do mundo, dificilmente se sentirão motivados a procurar o
caminho.
Confesso que também sofri builling
na escola primária. Sempre houve brincadeiras maldosas entre colegas. Mas nada
que provocasse os rancores assassinos das chacinas acontecidas em escolas e
universidades, hoje .
As sofisticadas aparelhagens policiais de agora não estão conseguindo
vencer os métodos cada vez mais aperfeiçoados das quadrilhas organizadas.
Presídios nunca serão suficientes para tantos bandidos.
Gosto de seriados policiais da TV. Mas apenas das partes em que os
detetives encontram os culpados, e a Justiça os condena. Programa como Criminal
Minds não me atraem, porque mostram crueldades com as vítimas.
Mas enquanto penso que estou assistindo à ficção, os mesmos enredos das
séries estão acontecendo entre nós: mocinhas de quinze anos orgulhando-se de
serem prostitutas, jovens traficando drogas e assassinando rivais. Com
perversidade. De arrepiar os cabelos.
E neste mundo que está ficando tão diferente do antigo, os idosos
procuram ajustar-se, e o primeiro mandamento que lhes ensinam é este: “nada de
conselhos, fica na tua.”
Para o outro, que eu agora estou desobedecendo “no meu tempo não era
assim...”, peço contritamente perdão, mas confesso que eu precisava desse
desabafo. Já passou.
Vou agora encontrar-me com a “galera”: um grupo de senhoras da minha
idade para o nosso almoço de domingo. Falaremos de assuntos alegres, nada de
saudosismos e em nenhum momento a frase tão incompreendida pelos jovens: “ no
meu tempo...”
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