sábado, 27 de setembro de 2014

OS VAIVÉNS DA MODA







Vivemos em círculos: a Terra é redonda... Decorridos tantos anos, depois de esquecidas, as modas retornam com força.  Na última semana soube que o frivolité, o tricô circular e a palha de trigo - trabalhos de artesanato do século passado - estão em alta em Caxias do Sul. Graças ao trabalho de incentivo e divulgação de uma caçapavana por lá radicada há várias décadas. Aly Chaves, reconhecida tapeceira, que já exportou seus produtos além das fronteiras do Brasil e enfeitou muitos lares locais - é hoje membro do Conselho Municipal de Cultura daquela cidade. Com grande entusiasmo ela convida senhoras aposentadas, que já largaram as agulhas e demais objetos de seu trabalho artesanal, para voltaram à ativa e exporem suas obras em shoppings e galerias, onde estão fazendo sucesso. Em visita a nossa cidade, ela deixou um convite para a Exposição de Artesanato de Origem Renascimento da Técnica – Curso e Oficina - que foi até dia trinta de setembro na Galeria da Universidade de Caxias do Sul. Sob o patrocínio da Prefeitura de lá!
O público caxiense está encantado com a exposição, e as artesãs mostram-se bem animadas a voltar a essas atividades que já consideravam sem valor.
Pois é, olhando um guardanapo de frivolité a gente fica pensando como é que mãos humanas conseguem chegar àquele efeito tão encantador, mas complicado demais para nós, leigos. Lembro a nossa última frivoliteira -  a dona Euza da Costa,  já falecida -   com sua almofada apropriada para o trabalho e aqueles instrumentos estranhos que pareciam pequenas castanholas:  o resultado era sempre maravilhoso. Ninguém, que eu saiba, herdou sua técnica. Trabalhoso demais, os tempos são outros e as atividades femininas também.
As matronas de velhas épocas faziam questão de ensinar as filhas a tecer, bordar, ocupar-se com tarefas úteis, que serviriam para os baús de enxoval, e assim não ficar à toa, pensando em coisa ruim... A preguiça é a mãe de todos os males, diziam. E as meninas, sonhando com seus príncipes encantados, iam tecendo, tecendo até eles chegarem e as levarem a novas tarefas domésticas nada românticas. Coitadinhas!
No meu tempo de moça as mulheres já trabalhavam fora do lar. Professoras, enfermeiras, bancárias, comerciárias e outras profissões. Assim, os trabalhos de costura, bordados e demais enfeites ornamentais ficavam a cargo de poucas artesãs que entendiam muito bem do assunto. A Brigilda, por exemplo, quem melhor do que ela para confeccionar os buquês e grinaldas de noiva na cidade? Eram verdadeiras obras de arte. Às vezes ela não dava conta das encomendas, ainda mais que seu temperamento era instável, hoje diríamos que ela era bipolar. Diversas vezes as noivas ficaram sem esses adereços que sempre fizeram parte do traje nupcial, e tinham de improvisar de última hora algo parecido. Porque a Brigilda se fechava em casa – sua fortaleza – e ficava dias e dias sem atender ninguém. Temperamento de gênios, o que fazer?!
Hoje nossa cidade está cheia de mulheres talentosas exibindo suas criações que encantam turistas de outras paragens. A cada dia surgem novas técnicas de artesanato que demandam cursos e exposições. De não ficar devendo a rendeiras nordestinas, bordadeiras cearenses nem outras.

A diferença do passado é que elas fazem por prazer e porque têm o dom. Mas, ao contrário de suas ancestrais, esse trabalho não é para impedir que coisas ruins ocupem os pensamentos de jovens inocentes do passado, mas para exorcizar de sua mente de mulheres esclarecidas da atualidade as imagens de uma época de violência, individualismo e desamor que imperam no mundo.  Seu propósito é dar um toque de amor aos lares, onde os diálogos são cada vez mais raros por falta de tempo, nesse ritmo vertiginoso de nossos dias. São mensagens de afeto que calam fundo no coração da gente.

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

MADE IN CHINA


Na minha última temporada na praia, alguém me encomendou um chapéu Panamá que fosse dos originais. Procurei dias e dias, na beira do mar, mas os vendedores ambulantes só tinham os “made in China”. Foi quando descobri que os vestidos, saídas de banho e muitos outros produtos também eram de lá. Aos poucos, fui-me informando que as fábricas de tecidos no Brasil pertencem ao passado. Velhos tempos das fábricas Bangu e outra de que não me lembro o nome! Eram pernambucanas, e num certo verão foi aquela avalanche de tecidos de algodão, cada qual mais bonito e fresquinho, que invadiram nossas lojas. Casas Pernambucanas, Casas Buri...  Dava gosto percorrer as prateleiras e escolher dentre aquelas padronagens tão variadas  a  que melhor nos agradasse.
Os romances que eu lia então -  de Pearl Buck e A. J. Cronin - falando de uma China pobre e atrasada –  perderam sua validade. Agora aquele país nos supera na indústria e na economia. Talvez até na educação. Nossas produções são outras. Quem sabe é porque fazer fios não resolve os problemas deste momento que estamos vivendo  - a era da informática.
Vieram-me lembranças de tempos idos, quando mandar fazer um vestido para alguma data especial era um grande acontecimento. Para um baile, aniversário, casamento ou uma viagem de férias... Escolher o tecido, os enfeites, a costureira e o que era muito importante – o feitio. Lembro o primeiro vestido “made” por mim mesma, no primeiro ano de minha vida profissional, de autonomia financeira, fora da casa dos pais.
Na cidadezinha onde eu lecionava foi fácil escolher a “modista”, que era a melhor na opinião geral. O tecido, amarelo, de algodão, ondulado feito favo de mel. Não precisava passar a ferro, uma novidade Bangu. Escolhi uma renda para a pala, e o tom ficou um pouco mais escuro, mas tudo bem, nunca fui perfeccionista nesses assuntos de moda. Diversas vezes, na rua, alguém me dizia que o vestido estava ficando muito bonito. A “mídia” já funcionava... No baile não me faltaram pares. Houve um que me achou um “doce de coco” com aquele vestido. Não perguntei se ele gostava do doce. Com certeza.
Os enxovais das noivas daquela época levavam bom tempo para ficarem prontos. Um ano ou dois. Lençóis e camisolas, toalhas de chá bordados com esmero e uma gama de outros panos que já saíram de moda, como as saias de baixo e as anáguas. As peças de algodão ou de linho, tudo ou quase tudo era buscado nas Casas Pernambucanas. Quando chegou a minha vez – quase fiquei prá titia – já era diferente. Surgiu o tergal que era mais prático, e não precisava de bordados, só um enfeitezinho nas bordas e nas fronhas renda ou bordado inglês, e pronto.
Outros vestidos contaram minha história, como o de seda rosa de um longínquo primeiro do ano cheio de expectativas felizes. E aquele verde claro que prenunciava a primavera que eu sempre recebia com tanta vibração e renovada vontade de viver. Fico feliz de pensar que cumpriram sua missão.
Não tenho inveja da China. Tenho é pena dos chineses, principalmente daquelas operárias de tecelagens ganhando tão pouco e trabalhando demais. Para que seu país e os patrões enriqueçam com a concorrência de preços baixos no mercado internacional. Prefiro nossa vidinha mais folgada, com tempo para curtir o sol, as férias, os amigos. Somos alegres e livres. Um povo que sabe acolher e viver em paz, embora nossa economia deixe a desejar. Nem tudo é perfeito.
Lembro a expressão do vendedor nordestino quando a contragosto me decidi pelo chapéu “made in China”:
- O importante é ser feliz.