Não é preciso ir longe, basta ligar a televisão. O mundo torna-se
pequeno, tudo bem próximo. Assim, é possível ver as comemorações dos japoneses
pelo surgimento das cerejeiras em flor a cada nova primavera. Feriado nacional.
O povo nos parques, nas praças, nos jardins.
O verde da grama, o riacho tranquilo, as pontezinhas de arquitetura bem
característica, os barquinhos com casais
japoneses deslizando mansamente, enquanto admiram os ramos floridos de centenas
de cerejeiras debruçadas sobre as margens, são imagens que nos sensibilizam
profundamente.Que nós podemos apreciar,
comodamente sentados à frente da TV, este
belo espetáculo representando a vida que está do outro lado do mundo. Revividas
com respeito comovido pelos japoneses de São Paulo que, por força das
circunstâncias, tiveram de transplantar-se para o lado de cá.
Nós, brasileiros, costumamos comemorar datas de batalhas e de guerras,
datas de morte de mártires e de heróis.
Eles, não. Gostam de comemorar a vida. E sua história, mil vezes mais longa
que a nossa, não tem nada de mansa. Mais violenta que os nossos gritos do
Ipiranga.
Tudo bem! Aos mártires e heróis, a coroa que merecem. Mas não seria mau
também comemorar de vez em quando a vida.
E há tanta coisa para celebrar, graças a Deus. A começar pelo pátio da
vizinha com um pequeno pomar onde as laranjeiras estão carregadinhas de flores
perfumosas, promessas de frutos maduros.
Em nossos longos invernos, é muito bom contar com essas frutas tão cheias
de vitaminas. Tal como admirar as cerejeiras em flor dos japoneses, comer
laranjas em nossa terra também segue o seu ritual. Valeria a pena conservar a tradição da família
caçapavana que até há poucos anos costumava reunir-se após o almoço para
saboreá-las à frente da casa ou no pátio, ao sol do inverno. De preferência
colhendo-as diretamente do pé.
Um ritual seguido à risca era o ato de descascar a fruta. Tarefa dos
adultos, enquanto as crianças ficavam pedindo mais e mais. E exigiam - Quero com tampa. Mas, se fossem de umbigo, o
melhor seria em gomos, Havia os perfeccionistas que cavavam um pequeno buraco
no topo da laranja, por onde era possível chupar o suco sem deixá-lo escorrer
fora.
As crianças maiores, e os jovens, iniciavam-se nessa arte, fazendo
competições: quem descasca mais ligeiro e sem fazer cortes na pele branca. Acontecia
de saírem cascas perfeitas, que eram depois dependuradas a secar no varal.
Lembram-se para que serviam? No fogão a lenha, transformavam-se em gravetos
sequinhos, muito bons para iniciar o fogo.
Hoje as coisas mudaram. Não há mais quintal nem pomares, pelo menos nas
cidades maiores. As laranjas vêm empacotadas em saquinhos plásticos dos
Supermercados. Perderam o seu cheiro e até o sabor. Não se sabe de onde elas
vêm. Nem conservam um galhinho com folhas verdes, tão boas para o chá que cura
resfriados e faz baixar a febre.
Hoje há máquinas para fazer suco em quase todos os lares. Gerações e
gerações estão-se criando sem aprender a descascar uma laranja, nem a mastigar
seu bagaço.
Mas estamos em Caçapava, terra dos “papa-laranjas”, e se não as temos no
quintal, não nos faltam os fregueses das chácaras próximas para trazê-las até
nós.
Um poeta disse que as rosas são as mais democráticas de todas as flores.
Porque são vistas tanto nos jardins das mansões como nos ranchos mais humildes,
com seu perfume e beleza. Assim digo eu das laranjas: estão na mesa do rico,
mas também servem de sobremesa ou aperitivo ao mais pobre que não tem açúcar
para fazer doces.
Quem viu as cerejeiras em flor do Japão do Discovery deve ter lembrado de
outro espetáculo que não perde para o primeiro: é o que assistimos todos os
anos, quando nossas laranjeiras florescem. Vale a pena estar bem próximo para
admirá-lo e sentir o suave perfume.
Mesmo que os ventos soprem forte, despetalando as flores em tapete branco
pelo chão, outras conseguirão tranformar-se em frutos, e o espetáculo da vida
se renovará sempre diante dos olhos de quem desejar apreciá-lo. Ao vivo...
Isso não é um bom motivo para comemorar?
Parabéns professora pela iniciativa de utilizar a tecnologia para nos proporcionar belas leituras. A senhora é um grande exemplo, depois de tantas conquistas na vida podia estar em uma boa cadeira de balanço vestida com o pijama da vitória e está aqui, inovando para levar conhecimentos a todos que admiram a arte das palavras.
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