sexta-feira, 17 de julho de 2015

APELOS DA TERRA






A gravura no calendário ilustrava o mês de agosto. Um campo verdinho prenunciando a primavera, com terneirinhos e cordeiros saltitando cheios de vida junto a suas mamães satisfeitas.
Lembrei que era esta a paisagem que me encantava nas minhas viagens de serviço ao interior do município nos anos sessenta. Foi quando aprendi que agosto era o mês em que tudo começava a acontecer. A terra, os campos e os animais, castigados pelas intempéries do inverno, agora renasciam em todo o seu esplendor. Um espetáculo lindo e cheio de esperança.
As estradas de terra batida, às vezes barrentas, outras com buracos e muita poeira, nada incomodava os passageiros do ônibus acostumados à vida na campanha. Todos se conheciam, e a conversa se estendia versando sobre o tempo, os cuidados com a criação, as plantações e as notícias sobre os acontecimentos familiares e de amigos. De longe em longe o motorista deixava encomendas nas porteiras, ora um tarro de leite, que ele largava porteiras adiante ou levava até a cidade, ora para receber encomendas da farmácia ou correspondência para postar no Correio, tudo em perfeita sincronia. Também parava para receber seus presentes que um agricultor ou criador lhe oferecia. Pernil de porco, dúzias de ovos, queijo, sacos de laranjas, até galinhas, que ele recebia agradecido, mas sabendo que bem os merecera pelos serviços prestados.
A cada passageiro que desembarcava, o condutor ajudava a descarregar a bagagem e esperava pacientemente que terminassem as despedidas e recomendações às famílias. Ninguém tinha pressa, o importante era se comunicarem e sentirem que a viagem até a cidade rendera o fruto esperado. Voltar são e salvo aos pagos, tirar a roupa domingueira e colocar-se à vontade para os trabalhos do campo - mas antes dar uma mateada para contar as novidades – era um instante de grande satisfação.

Apesar de ser uma alienígena no meio deles –  era a única passageira “sem terra” – eu me sentia parte daquela história, pois quantas vezes desejei descer em alguma propriedade que tivesse arvoredos e açudes e ali fixar raízes.Uma saudade atávica da vida no campo que meus antepassados devem ter deixado no meu DNA.

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