A gravura no calendário ilustrava o mês de agosto. Um campo verdinho
prenunciando a primavera, com terneirinhos e cordeiros saltitando cheios de
vida junto a suas mamães satisfeitas.
Lembrei que era esta a paisagem que me encantava nas minhas viagens de
serviço ao interior do município nos anos sessenta. Foi quando aprendi que
agosto era o mês em que tudo começava a acontecer. A terra, os campos e os
animais, castigados pelas intempéries do inverno, agora renasciam em todo o seu
esplendor. Um espetáculo lindo e cheio de esperança.
As estradas de terra batida, às vezes barrentas, outras com buracos e
muita poeira, nada incomodava os passageiros do ônibus acostumados à vida na
campanha. Todos se conheciam, e a conversa se estendia versando sobre o tempo,
os cuidados com a criação, as plantações e as notícias sobre os acontecimentos
familiares e de amigos. De longe em longe o motorista deixava encomendas nas
porteiras, ora um tarro de leite, que ele largava porteiras adiante ou levava
até a cidade, ora para receber encomendas da farmácia ou correspondência para
postar no Correio, tudo em perfeita sincronia. Também parava para receber seus
presentes que um agricultor ou criador lhe oferecia. Pernil de porco, dúzias de
ovos, queijo, sacos de laranjas, até galinhas, que ele recebia agradecido, mas
sabendo que bem os merecera pelos serviços prestados.
A cada passageiro que desembarcava, o condutor ajudava a descarregar a
bagagem e esperava pacientemente que terminassem as despedidas e recomendações
às famílias. Ninguém tinha pressa, o importante era se comunicarem e sentirem
que a viagem até a cidade rendera o fruto esperado. Voltar são e salvo aos
pagos, tirar a roupa domingueira e colocar-se à vontade para os trabalhos do
campo - mas antes dar uma mateada para contar as novidades – era um instante de
grande satisfação.
Apesar de ser uma alienígena no meio deles – era a única passageira “sem terra” – eu me
sentia parte daquela história, pois quantas vezes desejei descer em alguma propriedade
que tivesse arvoredos e açudes e ali fixar raízes.Uma saudade atávica da vida
no campo que meus antepassados devem ter deixado no meu DNA.
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