Na casa que guardo na memória, eu vejo meus fantasmas queridos em toda a
parte. Vários anos sem o prazer de levar-lhe um presente no Dia dos Pais, é a
sua figura em especial que eu revivo nesta data. Hoje releio os cartões de
felicitações que ele guardava como um tesouro. Diziam coisas muito ternas,
saídas do fundo de nossos corações: “Pai querido/ nós precisamos de ti./ Dos
teus valores, que a vida nunca modificou; /da tua dignidade, que nos torna
orgulhosos de sermos teus herdeiros;/ de tua bondade, de teu imenso amor.” Ou
assim: “Teus cabelos brancos, que te distinguem de longe, são para nós um
símbolo do verdadeiro e heróico Pai.”.
Com saudade revejo meu pai no seu dia-a-dia em todos os estágios de nossa
vida abençoada, pois que o tivemos até nossa 3ª idade entre nós. Revejo o pai
preocupado com a segurança do lar, verificando se as aberturas, portas e
janelas, estavam bem fechadas quando alguma tempestade se anunciava. Ou ao sair
com toda a família para o passeio dos domingos. Da porta da rua ainda voltava
para desligar a chave geral.
Meu pai preocupado com os assuntos do trabalho, e minha mãe pedindo
silêncio à mesa de refeições para não perturbá-lo.
Meu pai preocupado com nossos estudos e a economia forçada no lar para
poder mantê-los, no tempo em era preciso migrar de Caçapava para conseguir um
diploma.
Naquele tempo, a Rua Sete ainda descalça via-nos passar nas tardes de
domingo para a visita aos avós, como um ritual. Parecia tão longe, mas o
percurso se fazia agradável, os pequenos à frente, e o casal de braço dado logo
atrás, naquele diálogo sempre eloquente de quem tinha muito a compartilhar e
que prosseguiu até a morte.
Vejo meu pai, mais tarde, preparando-se para a aposentadoria que ele
temia como a morte em vida.
Mas , qual! Foi quando ele se entregou ao prazer de observar
seus netos e bisnetos nas brincadeiras infantis. A mãezinha podia ficar
descansada conversando com as mulheres da família, nos seus encontros quase
diários. Pois o vovô se responsabilizava prazerosamente pela segurança dos
pequenos.
Nos veraneios da família na praia e nas festas conjuntas de todo o “clã”,
ele era a figura bem humorada e prestativa, providenciando refrigerantes para
os netos, oferecendo caronas para sanar algum imprevisto, ou buscar a torta
encomendada e os frios para a comemoração de algum aniversário.
Ninguém se lembra de tê-lo visto acomodado na melhor poltrona pedindo que
lhe alcançassem qualquer coisa, como um copo d´água. Ele mesmo se servia e
ainda se levantava ligeirinho para arrebatar algum pacote pesado que uma das
senhoras da família carregasse.
Meu pai era a visita diária, chovesse ou fizesse sol, à netinha doente
que já conhecia seus passos e se alegrava com a sua chegada.
Meu pai era uma pessoa feliz, porque seu coração só continha bondade e
vontade de ajudar a todos.
Como dizia um dos cartões que descobri em seus guardados, repito ainda hoje:
“Ao nosso pai sempre jovem de espírito, que nos deu a vida e exemplos de
como honrá-la e alegrar-nos com ela, o nosso amor e gratidão.”
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