Quando penso nas drásticas transformações ocorridas no mundo, nas últimas
décadas, fico admirada de ver como as opiniões, antes tão seguras, sobre
relacionamentos familiares, sociais e profissionais, agora são bem vagas e contraditórias. Parece que a ética
também mudou. É um salve-se quem puder, porque a vida é breve e temos de
gozá-la do melhor modo possível.
A renúncia do Papa Bento XVI foi algo inédito. Pelo menos nos nossos
tempos. Coisa que jamais se cogitou. O que dizer do juramento de “até que a
morte nos separe”?
Na minha juventude, surgiram as primeiras tentativas de implantar o
divórcio no país. Não aprovei. Questão de religião e de berço. Vim de um lar
muito feliz.
Fui convidada, por um grupo de acadêmicos da cidade onde comecei meu
magistério para um debate sobre o assunto. Eles eram modernos e a favor. Eu,
contra. Pedi reforço para meu diretor espiritual, o saudoso Pe. Aquiles
Sponchiado, que se entusiasmou e me mandou encíclicas e outros documentos da
Igreja para ajudar-me. Preparei-me do melhor modo possível, mas sabia que os
meus adversários eram muito bons de oratória. Estudantes de Direito... O debate
foi sendo adiado por causa de outros compromissos dos rapazes, e graças a Deus,
ficou só nos planos. Não aconteceu.
Hoje, revendo nossas vidas, constato que os dois universitários a favor
do divórcio foram fiéis ao juramento feito no altar. Um deles até a morte, o
outro ainda vive com a esposa. Só eu quebrei o compromisso.
Naquela mesma época, um senhor, numa roda de amigos, dizia que toda
mulher pode ser boazinha quando namorada ou noiva. Mas depois de casada tenta,
até não poder mais, mudar o jeito de ser do marido. Eu contrariei-o, dei o
exemplo das mulheres de minha família, mas ele não acreditou. Você é muito
meiga e cordata, mas deixa acontecer. Espere até casar. Mais tarde, não é que
ele estava certo? Por duas vezes, que me lembro, dei razão ao ditado “Desta
água eu não bebo”. Pura ilusão, as coisas mudam, a vida é uma caixinha de
surpresas, e a gente precisa adaptar-se às mudanças.
Nos meus verdes anos soube do suicídio de uma senhora idosa em nossa
cidade. Motivo: não suportava os maus tratos do marido, um fazendeiro sisudo,
arrogante, do tipo dos personagens da minissérie “Gabriela, Cravo e Canela”.
Lembro que pensei na época: por que ela não esperou a morte? Estava tão perto,
pela idade! Puro engano! A coitada tinha só setenta anos. Hoje eu a
consideraria uma “guria”. E a solução,
na minha ótica atual, seria o divórcio. Que mudança na minha cabeça!
A renúncia do Papa deve ter muito a ver com isso. Casamentos
indissolúveis. E a felicidade onde fica? O celibato dos padres, e as tentações
explícitas em toda a parte. Os recursos
financeiros para cumprir a evangelização pelos recantos do mundo. Bancos do
Vaticano, dinheiro, poder, tentações... Desvirtuamento dos planos de Cristo. É
preciso fortalecer a fé para que a barca dos pescadores não naufrague em águas
impuras. Quanto compromisso, e a saúde enfraquecendo, as forças abandonando-o.
O Chefe Supremo certamente aceitou os seus motivos.
Mais um sobrevivente da noite trágica de Santa Maria deixou de resistir.
Um mês lutando pela vida. São agora duzentos e quarenta... Ficou uma lição de
solidariedade, heroísmo, desprendimento. Mas a dor permanece.
Finalmente uma chuvinha para amenizar o calorão deste início de março. O
tempo de levar um casaquinho leve no braço para a frescurinha da tarde já
passou. A temperatura não baixa mesmo à noite. Tudo muda, e nós não podemos?
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