domingo, 3 de março de 2013

DESSA ÁGUA NÃO





Quando penso nas drásticas transformações ocorridas no mundo, nas últimas décadas, fico admirada de ver como as opiniões, antes tão seguras, sobre relacionamentos familiares, sociais e profissionais, agora são  bem vagas e contraditórias. Parece que a ética também mudou. É um salve-se quem puder, porque a vida é breve e temos de gozá-la do melhor modo possível.
A renúncia do Papa Bento XVI foi algo inédito. Pelo menos nos nossos tempos. Coisa que jamais se cogitou. O que dizer do juramento de “até que a morte nos separe”?
Na minha juventude, surgiram as primeiras tentativas de implantar o divórcio no país. Não aprovei. Questão de religião e de berço. Vim de um lar muito feliz. 
Fui convidada, por um grupo de acadêmicos da cidade onde comecei meu magistério para um debate sobre o assunto. Eles eram modernos e a favor. Eu, contra. Pedi reforço para meu diretor espiritual, o saudoso Pe. Aquiles Sponchiado, que se entusiasmou e me mandou encíclicas e outros documentos da Igreja para ajudar-me. Preparei-me do melhor modo possível, mas sabia que os meus adversários eram muito bons de oratória. Estudantes de Direito... O debate foi sendo adiado por causa de outros compromissos dos rapazes, e graças a Deus, ficou só nos planos. Não aconteceu.
Hoje, revendo nossas vidas, constato que os dois universitários a favor do divórcio foram fiéis ao juramento feito no altar. Um deles até a morte, o outro ainda vive com a esposa. Só eu quebrei o compromisso.
Naquela mesma época, um senhor, numa roda de amigos, dizia que toda mulher pode ser boazinha quando namorada ou noiva. Mas depois de casada tenta, até não poder mais, mudar o jeito de ser do marido. Eu contrariei-o, dei o exemplo das mulheres de minha família, mas ele não acreditou. Você é muito meiga e cordata, mas deixa acontecer. Espere até casar. Mais tarde, não é que ele estava certo? Por duas vezes, que me lembro, dei razão ao ditado “Desta água eu não bebo”. Pura ilusão, as coisas mudam, a vida é uma caixinha de surpresas, e a gente precisa adaptar-se às mudanças.
Nos meus verdes anos soube do suicídio de uma senhora idosa em nossa cidade. Motivo: não suportava os maus tratos do marido, um fazendeiro sisudo, arrogante, do tipo dos personagens da minissérie “Gabriela, Cravo e Canela”. Lembro que pensei na época: por que ela não esperou a morte? Estava tão perto, pela idade! Puro engano! A coitada tinha só setenta anos. Hoje eu a consideraria uma “guria”.  E a solução, na minha ótica atual, seria o divórcio. Que mudança na minha cabeça!
A renúncia do Papa deve ter muito a ver com isso. Casamentos indissolúveis. E a felicidade onde fica? O celibato dos padres, e as tentações explícitas em toda a parte. Os  recursos financeiros para cumprir a evangelização pelos recantos do mundo. Bancos do Vaticano, dinheiro, poder, tentações... Desvirtuamento dos planos de Cristo. É preciso fortalecer a fé para que a barca dos pescadores não naufrague em águas impuras. Quanto compromisso, e a saúde enfraquecendo, as forças abandonando-o. O Chefe Supremo certamente aceitou os seus motivos.
Mais um sobrevivente da noite trágica de Santa Maria deixou de resistir. Um mês lutando pela vida. São agora duzentos e quarenta... Ficou uma lição de solidariedade, heroísmo, desprendimento. Mas a dor permanece.
Finalmente uma chuvinha para amenizar o calorão deste início de março. O tempo de levar um casaquinho leve no braço para a frescurinha da tarde já passou. A temperatura não baixa mesmo à noite. Tudo muda, e nós não podemos?

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